Nasce a web e quase ninguém percebe
Alguns malucos e durangos acham que a web pode revolucionar o mundo
Investidores com dinheiro infinito resolvem apostar na história
Os investidores criam, como sempre, uma grande bolha
Os malucos são promovidos a "interativos" e seus salários e cargos saltam meteoricamente
Os gigantes de TI tentam pegar entrar no bonde e sentar na janelinha
A bolha estoura e todos vão pra rua da amargura
Todos aprendem a lição: basta criar hype e o dinheiro aparece do nada
Surgem ondas de hype: second life, e-learning, vortais, blogs, todos conseguindo bater a carteira do mercado por um tempo limitado
Quando digital não é mais hype, ele se comoditiza e ninguém ganha mais dinheiro
Os "interativos" descobrem que pose é tudo e investem na própria aura de arautos do futuro
A academia cria coragem e resolve abraçar a onda, transformando a disrupção criada por exploradores, tinkerers e drop-offs de
universidades em algo magicamente alinhado com profundíssimos pensadores europeus que nunca tiveram um pingo de influência na história toda
As agências digitais descobrem o velho truque: ganhar dinheiro fácil com mídia
Google surge do nada, desintermedia a mídia e começa a Primeira Grande Extinção
"Interativos" resistem ferrenhamente contra o fim inevitável e insistem em ganhar dinheiro enquanto podem
Depois do Big Bang que foi o Google vem o Grande Buraco Negro, o facebook
Agências colapsam, veículos colapsam, carreiras colapsam mas surge um novo front de negação do inelutável: palestras e ciberotimismo
O sonho da web 2.0 e "cauda longa" também capota, e os blogueiros mais espertos rapidamente se transformam em evangelistas de social media, e inventam métricas sem valor concreto para motivar empresas inseguras e fundamentar uma explosão de cursos de ocasião.
Numa longa estiagem de novos hypes surge o mito messiânico das "tecnologias exponenciais"
O mundo corporativo desiste das agências que só vêem digital como mídia e começa a inovar sozinho
As gigantes de consultoria tentam escapar da entropia contratando de baciada "interativos" que a tornem mais sexy
Ao contrário dos sonhos iluministas e libertários dos malucos durangos dos primórdios, o digital vai se tornado uma distopia cada vez mais tóxica e desigual
Na ausência crescente de uma visão mais apaixonante de futuro, cresce uma onda quase religiosa de palestras e eventos recheados de visionários e gurus
O dinheiro desaparece do mercado e se concentra exponencialmente em pouquíssimos players que engolem qualquer inovação que os ameace.
Enquanto isso todos os envolvidos há 23 anos nessa montanha russa inventam as histórias mais mirabolantes para manter a aura fugaz que conquistaram por acaso e disfarçar o indisfarçável: como Cronos, o digital devora os próprios filhos.
René de Paula Jr. é um especialista em projetos interativos que trabalha com internet desde 1996. Trabalhou em grandes empresas como AgenciaClick, Yahoo! Brasil, Microsoft e Locaweb.
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